O rosto da Amazônia

FSP, Tendências/Debates, p. A3 - 14/06/2013
O rosto da Amazônia
Fomos em busca dos homens e mulheres responsáveis por práticas que contribuam para o aperfeiçoamento da gestão das unidades de conservação

João Augusto Ribeiro Nardes

Euclides da Cunha esteve na Amazônia em 1905 para estabelecer os limites da fronteira entre Brasil e Peru. Entre os escritos que produziu, destaca-se o referente aos povoadores, gente sem a qual a região "seria um deserto", brasileiros que atuaram como mediadores entre a "gente nova" que chegava e "as tribos bravias que ocupavam as margens dos rios".
Anotou que quase não havia famílias e que se pressentia em tudo "uma perpétua véspera de viagem naquelas escalas provisórias em que o homem predetermina ficar um, dois, três anos no máximo, para enriquecer e partir, e não voltar".
Situação de baixa coesão social, que exigia outros estímulos, "para além do anseio da riqueza fácil", que pudessem assegurar a permanência do homem.
Mais de cem anos se passaram e ainda podemos sentir parcela da angústia do escritor. A Amazônia abrange cerca de 7 milhões de quilômetros quadrados. É a maior floresta tropical do mundo, e o bioma Amazônia abrange oito países além do Brasil.
Que estímulos são necessários para assegurar a permanência do homem? O desenvolvimento de atividades como agricultura, pecuária, mineração, indústria e turismo, além do grande interesse científico que existe sobre a área, demandam sistema eficiente de governança.
O Tribunal de Contas da União (TCU) assinou termo de cooperação técnica com tribunais de contas estaduais para a realização de auditoria coordenada com o objetivo de avaliar a gestão das unidades de conservação (UC).
Considerada uma das principais estratégias internacionalmente reconhecidas para conservação da biodiversidade, as UC integram o Sistema Nacional de Unidades de Conservação (Snuc), que protege aproximadamente 1,5 milhão de quilômetros quadrados do território brasileiro e engloba 312 unidades federais e 610 estaduais.
No mês de maio, a convite do Instituto Chico Mendes para a Conservação da Biodiversidade (ICMBio), realizamos visita técnica à Floresta Nacional do Tapajós e à Reserva Extrativista Tapajós-Arapiuns (Resex), no Estado do Pará.
Fomos em busca do rosto da Amazônia, dos homens e mulheres responsáveis por boas práticas que contribuam para o aperfeiçoamento da gestão das UCs localizadas no bioma Amazônia.
Lá encontramos gente como Antônio Oliveira, o Mucura, 75, que empresta sua experiência aos alunos da Escola da Floresta, em Santarém, e ensina formas sustentáveis de exploração dos recursos naturais.
Ou como Raimundo Pedroso, 73, que lidera a comunidade Maguari, às margens do rio Tapajós.
Mulheres como Maria Odilia, presidente da associação dos moradores da comunidade de Anã, na Resex, que, com o apoio das Mulheres Sonhadoras em Ação (Musa), desenvolve projeto sustentável de criação de tambaquis.
São todos exemplos de boas práticas coletadas pela auditoria e que, ao final, serão transmitidas aos outros países da Amazônia.
O trabalho apenas começou. As equipes devem visitar cerca de 25% das unidades de conservação situadas no bioma, e os resultados deverão subsidiar trabalho conjunto com as entidades membros da Organização Latino-Americana e do Caribe de Entidades Fiscalizadoras Superiores (Olacefs), atualmente presidida pelo TCU.
Em parceria com os países vizinhos, vamos tentando vencer "a guerra de mil anos contra o desconhecido", como Euclides da Cunha definiu a luta pelo conhecimento pleno da floresta, triunfo que virá "ao fim de trabalhos incalculáveis", quando, então, "não haverá segredos, e a definição dos últimos aspectos da Amazônia será o fecho de toda a História Natural".

João Augusto Ribeiro Nardes, 60, administrador de empresas, é presidente do Tribunal de Contas da União. Foi deputado federal (1995-2005) pelo PP-RS

FSP, 14/06./2013, Tendências/Debates, p. A3

http://www1.folha.uol.com.br/fsp/opiniao/113853-o-rosto-da-amazonia.shtml
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