Valor Econômico, Brasil, p. A4 - 22/02/2017
Parlamentares querem mais espaço para mineração na floresta amazônica
Daniela Chiaretti
O interesse na mineração de ouro em meio a áreas de floresta amazônica protegidas por lei é um dos motes da bancada de parlamentares do Amazonas, que pretende reduzir em mais de um milhão de hectares a extensão das unidades de conservação criadas no sul do Estado.
Essa foi uma das "preocupações" listadas por senadores e deputados do Amazonas ao ministro-chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha, durante reunião no dia 7: a "consolidação de atividades como pecuária, mineração e manejo florestal", que poderiam se confrontar com a existência de parques e reservas no sul do Amazonas, segundo relato de fonte do governo.
Os parlamentares mencionaram a Padilha "preocupações com empreendimentos licenciados para atividades de manejo florestal, exploração mineral (areia e ouro) e indústria". Citaram "empreendimentos licenciados e em análise no Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM)" para extração de ouro, areia, cascalho e chumbo.
O interesse na mineração coincide com estudo do WWF-Brasil ao qual o Valor teve acesso. Os ambientalistas levantaram os pedidos de pesquisa e lavra de minérios protocolados no DNPM para o sul do Amazonas e sobrepuseram a base de dados às áreas que os políticos querem retirar das unidades de conservação criadas nos últimos dias do governo Dilma Rousseff.
"O que apareceu foi explícito: a iniciativa, basicamente, é para retirar de dentro das unidades de conservação áreas com pedido de lavra mineral", diz Ricardo Mello, coordenador do Programa Amazônia do WWF-Brasil. "Este processo demonstra falta de transparência. Trata-se da apropriação de bens públicos por interesses privados, sem possibilitar que a sociedade participe da discussão."
O estudo do WWF mostra cerca de 150 processos minerários - a maioria de requerimento e autorização de pesquisa - na área a ser desafetada. São pedidos apenas protocolados ou autorização de pesquisas já concedidas. Há 13 lavras com pedido autorizado.
No Parque Nacional do Acari há cerca de 40 pedidos, entre requerimentos de pesquisa e de lavra, na maioria de ouro. Pela lei das unidades de conservação, parques são áreas de proteção integral e a única atividade econômica permitida é o turismo sustentável.
Na APA dos Campos de Manicoré, que seria extinta pela proposta dos parlamentares, os requerimentos mapeados pelo WWF tratam de jazidas de minério de ferro e cassiterita. "Há falta de informação e a mensagem errada de que todas as unidades de conservação serão bloqueadas para qualquer tipo de uso", diz Mariana Napolitano Ferreira, coordenadora de ciências do WWF-Brasil. "Brasília está em uma APA", ilustra.
As florestas de Urupadi e Aripuanã perderiam, juntas, o maior pedaço (820 mil hectares). As duas áreas concentram a maior parte dos pedidos de pesquisa e lavra (155 requerimentos no DNPM). A mineração de ouro concentra 80% dos pedidos, todos em escala industrial. O levantamento do WWF indica a intenção de explorar nióbio, cassiterita e minério de ferro.
"Se a exploração mineral é algo interessante para a região, o processo para se fazer isso tem que ser legítimo", diz Mello. Para se criar uma unidade de conservação, lembra Mariana, é preciso fazer estudos técnicos e validar o processo com audiências públicas - o que ocorreu com as UCs em questão. "Essas unidades de conservação foram colocadas nos municípios onde o desmatamento disparou nos últimos relatórios", lembra. Diz, no entanto, que o projeto nas florestas nacionais é construir uma economia florestal com o desenvolvimento de projetos de manejo.
A iniciativa dos parlamentares produziu forte controvérsia. O Ministério do Meio Ambiente alegou desconhecimento. Padilha reuniu-se com o ministro do Meio Ambiente, José Sarney Filho, na semana passada. Outra reunião irá acontecer entre 6 e 8 de março.
"Os parlamentares alegaram que os municípios da área de influência dessas UCs perderam espaço para produção de forma abrupta", disse fonte do governo. A criação de unidades de conservação leva anos e o processo sempre prevê consultas públicas.
Valor Econômico, 22/02/2017, Brasil, p. A4
http://www.valor.com.br/brasil/4877412/parlamentares-querem-mais-espaco-para-mineracao-na-floresta-amazonica#
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