Casas irregulares sobem a Serra de Madureira

OESP, Vida, p. A16 - 18/05/2006
Casas irregulares sobem a Serra de Madureira
Cerca de 30 novas casas são levantadas por mês em Área de Proteção Ambiental em Nova Iguaçu (RJ); até deputado federal já construiu lá

Roberta Pennafort

Uma das reservas ambientais mais importantes da Baixada Fluminense está em perigo. A construção irregular de barracos de madeira e casas de alto padrão avança sobre a Serra de Madureira, em Nova Iguaçu, parte da Área de Proteção Ambiental (APA) Gericinó-Mendanha. As edificações já destruíram 40% dos 4.440 hectares da serra. Ambientalistas calculam que 30 novas casas sejam erguidas por mês.
O Estado percorreu diversos trechos da serra e verificou que centenas de famílias estão instaladas ali - algumas há mais de 40 anos. Mas o ritmo se intensificou nos últimos anos. Até um deputado federal, Itamar Serpa (PSDB-RJ), cuja base eleitoral é no município, é dono de uma casa em situação irregular. Ele está construindo um imóvel grande acima da chamada cota cem (a mais de cem metros de altura). Serpa chegou a erguer um muro junto a uma pequena cachoeira, colado à casa.
Procurado pela reportagem, o deputado informou, por meio de um assessor, que o muro foi providenciado para evitar o assoreamento de um córrego, já que, com a força das águas, grande quantidade de areia desce do morro e é despejada em seu leito. O assessor disse que o terreno da casa de Serpa não foi invadido - foi adquirido de um sitiante - e que, se ficar constatado que a construção é ilegal, serão tomadas medidas para regularizar a situação.
Diante do desrespeito à área de proteção, ONGs e poder público se mobilizaram. A prefeitura de Nova Iguaçu começou recentemente a notificar moradores.
SEM ALTERNATIVA
A maior parte das construções na Serra de Madureira é de famílias pobres. A favelização se deu, assim como nos morros da cidade do Rio, pela falta de opções em solo plano. Próximo à casa do deputado Itamar Serpa reside a família de José dos Santos, de 84 anos. Ele e outras cinco pessoas ocupam um imóvel simples há onze anos - a casa, disse ele, existe há 40.
"Nunca me disseram que a área é protegida. Eu me preocupo com o meio ambiente, mas vou fazer o que? Não tenho para onde ir", afirmou Santos. "Já vi gente do Ibama, mas ninguém passou por aqui." O cunhado dele, José Oliveira, de 64 anos, gosta de viver no meio da mata. "É muito tranqüilo. De noite, só ouvimos os grilos." Eles admitem que os moradores da pequena comunidade lançam esgoto na cachoeira que fica perto da casa, por falta de saneamento. "Mas a luz a gente paga", garantiu Oliveira.
VULCÃO
Com 7.700 hectares, a APA Gericinó-Mendanha abrange os municípios de Nova Iguaçu, Mesquita e Rio de Janeiro (bairros da zona oeste). Na Serra de Madureira fica um vulcão inativo há 40 milhões de anos, que atrai grande quantidade de visitantes. As montanhas são muito utilizadas por quem aprecia turismo ecológico.
Como a região tem muitos problemas sociais graves, a questão ambiental tem sido negligenciada. "As leis existem só no papel, porque nem Estado, nem prefeitura fiscalizam", lamenta Gilvoneick Sousa, do grupo Defensores Ambientais do Gericinó-Mendanha-Tinguá.
Ele lembrou que, em fevereiro de 2005, depois do assassinato do ambientalista Dionísio Júlio Ribeiro Filho - que tinha forte atuação no município -, foi prometida a criação de uma guarda ambiental que até hoje não saiu do papel.
OTIMISMO
A administração de Nova Iguaçu diz que pode reverter a situação. "Aqui ainda há como controlar, diferente do que acontece no município do Rio, onde as favelas já tomaram conta de tudo", explica Celso Junius, gerente de reflorestamento da Secretaria da Cidade. "Temos que agir rapidamente, enquanto a ocupação ainda é incipiente. A serra é fundamental para toda região."
A prefeitura está realizando operações semanais para notificar moradores. Técnicos trabalham munidos de altímetros para verificar se a construção está acima da cota cem. Os problemas são analisados caso a caso, levando-se em consideração as necessidades de moradia da população. A decisão sobre quais casas devem ser destruídas será tomada depois.
A partir de setembro, serão replantadas mudas que estão sendo cultivadas num viveiro público. Nos quatro meses até o fim do ano, deverão ter sido plantadas na serra 45 mil mudas. O viveiro de Nova Iguaçu tem capacidade para produzir 400 mil mudas por ano de 40 espécies nativas da mata atlântica.

OESP, 18/05/2006, Vida, p. A16
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