Esta uma pergunta que constantemente se ouve no meio florestal. A resposta passa, em primeiro lugar, pelo entendimento da ecologia dessas florestas. Florestas tropicais se regeneram a partir da mortalidade natural das árvores (em média 2% das árvores morrem cada ano, o que é um pouco mais do que o dobro da taxa de mortalidade humana atual), ou a partir de eventos catastróficos como inundações, furacões, tempestades tropicais, deslizamento de terra, entre outros. Dependendo da intensidade e frequência desses eventos, essa recuperação pode levar de dezenas a centenas de anos. Se não forem convertidas a outros usos, diz-se que estão em equilíbrio dinâmico. O (bom) manejo de florestas tropicais tenta imitar esse processo, mas de modo controlado.
Em florestas tropicais onde se faz o aproveitamento do potencial madeireiro, ainda há muito ceticismo por parte de setores da sociedade quanto a essa capacidade. Nesse caso questiona-se, frequentemente, se o intervalo entre colheitas adotado (ciclo de corte) é suficientemente longo para permitir a recuperação do potencial produtivo da floresta. A história da silvicultura tropical nos mostra que ciclos muito longos, como os que já foram adotados em florestas africanas, que chegaram a ser de até 100 anos, não foram economicamente atrativos; no Sudeste da Ásia, em florestas onde predominam espécies da família Dipterocarpaceae, adotou-se um ciclo de 70 anos. Hoje em dia, adotam-se, de um modo geral, ciclos de corte que variam de 25 a 40 anos.
A Silvicultura Tropical não é uma atividade recente. Remonta há mais de 300 anos. Dawkins & Philip (1998) em seu livro "Silvicultura e Manejo de Florestas Úmidas Tropicais: uma história de sucessos e fracassos" nos ensinam que os sucessos sempre foram esquecidos em oposição aos fracassos, esses sempre lembrados. A sociedade não está devidamente informada, mas há inúmeros exemplos no mundo tropical de florestas bem manejadas tanto no passado, como no presente. A chave para o sucesso é a obediência às prescrições técnicas. Onde isso ocorreu houve sucesso. Na América Tropical o exemplo mais citado de floresta bem manejada é o Sistema Celos desenvolvido e aplicado no Suriname, que é um sistema de corte seletivo, ou sistema de manejo seletivo, o mesmo pesquisado há mais de 30 anos no Brasil. Esse sistema combina uma exploração bem planejada com silvicultura pós-colheita para garantir a sustentabilidade da produção volumétrica. No caso brasileiro, os resultados das pesquisas contribuíram decisivamente com a base técnica para a regulamentação do manejo florestal e foram incorporados à legislação ambiental (Instrução Normativa 5 de 11/12/2006 e Resolução 406 do CONAMA de 2/2/2009).
A chave para o sucesso de qualquer sistema manejo seletivo é a chamada "exploração de impacto reduzido - EIR". Este termo, junto com a "exploração convencional - EC" passou a fazer parte da terminologia florestal tropical nessas duas últimas décadas, para diferenciar uma exploração planejada e cuidadosa em oposição à extração de madeiras com mínimo (ou sem) planejamento e sem preocupação com a qualidade e composição das futuras colheitas. De fato, a aplicação do termo "impacto reduzido" se justifica, pois as pesquisas têm demostrado que a redução do impacto da exploração na floresta remanescente chega a 50-60% quando comparada à exploração convencional.
É importante que se entenda que o sistema de manejo seletivo aplicado em florestas tropicais não é direcionado a espécies individualmente ou a alguma espécie em particular. Sistemas direcionados a espécies individualmente, como o chamado "Sistema Uniforme Malaio" só são aplicáveis a florestas da família Dipterocarpaceae onde dezenas de espécies, os chamados "merantis", são de alto valor comercial.
Em florestas da África e da América Tropical, o manejo é direcionado a grupos de espécies e considera, entre outras coisas, o mercado. Parte-se da premissa que a composição florística das diversas colheitas será diferente a cada ciclo, havendo predominância de um ou outro grupo em um determinado momento no tempo. Impossível colher-se o mesmo volume de uma determinada espécie a cada ciclo, devido às diferentes velocidades de crescimento e características ecológicas das espécies alvo do manejo. O fundamental nesse sistema é garantir a perpetuidade das espécies colhidas, deixando-se certo número de indivíduos para garantir a sua reprodução. Por exemplo, no caso brasileiro, legislação exige que se deixe 10% dos indivíduos com tamanho de corte como porta sementes, fora aqueles que estão situados em áreas de preservação permanente, cujo corte é proibido, e aqueles com diâmetros abaixo do limite imposto pela legislação (50 cm). Espécies com baixa ocorrência (três árvores a cada 100 hectares) não podem ser colhidas.
O ciclo de corte projetado para Planos de Manejo na região Amazônica é 25-35 anos considerando uma produtividade média de 0,86 m3 ha-1 ano-1 (Instrução Normativa 5 de 11/12/2006 e Resolução 406 do CONAMA de 2/2/2009). A estimativa desse ciclo foi baseada nos estudos de crescimento em parcelas permanentes realizados na região.
Em Seminário realizado no ano passado, a Embrapa Amazônia Oriental apresentou os resultados de 30 nos de pesquisa silvicultural na Floresta Nacional do Tapajós. Em uma área onde foram colhidos 72 m3 ha-1 em 1979, intensidade mais do que o dobro da prevista na regulamentação do manejo florestal na Amazônia, a floresta recuperou 89% do volume de toda a comunidade com diâmetro maior ou igual a 45 cm e 65 % das espécies comerciais a partir desse mesmo diâmetro; a biomassa total superou a de uma floresta não explorada na mesma área. A produtividade volumétrica real observada foi de 1,9 m3/ha/ano e 0,9 m3/ha/ano respectivamente para toda as espécies e para as espécies comerciais. Esta última corrobora a prevista na legislação que é de 0,86 m3/ha/ano.
A exploração não causou alterações importantes na diversidade de espécies. Há uma dinâmica de entrada e saída de espécies como a que ocorre em florestas naturais, sem nenhuma intervenção. Trinta anos após a exploração há um estoque de espécies comerciais de 53 m3/ha com diâmetro maior ou igual a 50 cm, suficiente para uma nova colheita obedecendo à regulamentação atual do manejo florestal na Amazônia (Instrução Normativa 5 de 11/12/2006) que, para um ciclo de 30 anos, limita a intensidade a 25 me/ha.
Estamos no caminho certo. Até 2014 duas novas áreas estarão prontas para serem colhidas novamente, sendo uma delas ainda este ano.
Os franceses, para evitar polêmicas, chamam o manejo sustentável de "manejo durável". Embora a sustentabilidade não seja tão fácil demostrar em três décadas, a história da Silvicultura Tropical tem mostrado que é possível. E a sustentabilidade passa não somente pelos aspectos biológicos e ambientais, mas também pelo social e econômico. As concessões florestais, finalmente estabelecidas em nosso país, estão ai para demonstrar essa sustentabilidade.
Quem viver verá.
http://painelflorestal.com.br/noticias/artigo/13877/afinal-e-possivel-ou-nao-a-chamada-producao-sustentavel-em-florestas-tropicais
Florestas:Geral
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