Parques nacionais com fôlego para mais

OESP, Viagem, p. D4 - 24/02/2015
Parques nacionais com fôlego para mais
Com recorde de visitantes em 2014, mas aquém de sua capacidade, unidades de conservação buscam formas de atrair mais turistas sem deixar de lado a preservação

Felipe Mortara - O Estado de S. Paulo

A definição de "bonito por natureza" é normalmente associada às praias, mas o Brasil terminou 2014 com jeito de estar redescobrindo seu potencial ao ar livre. Apesar de os parques naturais ainda estarem bem distantes de serem opções tão concorridas quanto a areia e o mar, ao menos dois deles podem comemorar uma visitação recorde em 2014. No Rio, o Parque Nacional da Tijuca, onde fica o Cristo Redentor, recebeu 3,1 milhões de visitantes, enquanto as cataratas do Parque Nacional do Iguaçu, em Foz do Iguaçu, chegaram a 1,5 milhão de visitantes.
São números animadores, principalmente considerando que o total de visitas turísticas a parques brasileiros saltou de 1,9 milhão, em 2006, para 6 milhões, em 2013. Mas ainda há muito a ser feito. Nos Estados Unidos, por exemplo, 282 milhões de visitantes passaram pelas portarias de 58 parques nacionais em 2014, movimentando US$ 14,6 bilhões, além de 252 mil empregos.
O Brasil tem hoje 71 parques nacionais, patrimônio natural considerado o de maior potencial turístico em um ranking com outras 140 nações feito pelo Fórum Econômico Mundial, capaz de movimentar R$ 1,6 bilhão por ano. Embora haja dificuldades de infraestrutura, boa parte delas têm novidades, ainda que tímidas, para atrair mais visitantes (leia mais abaixo).
Contudo, distribuir a demanda ainda é um desafio. "Os parques nacionais não fazem parte do imaginário brasileiro. Cerca de 90% das visitações vêm de dois deles, o do Iguaçu e o da Tijuca. Porém, não é uma real visitação aos parques, mas aos atrativos Cristo e Cataratas", acredita Ana Luisa da Riva, diretora do Instituto Semeia, que estuda formas de aperfeiçoar a gestão de áreas protegidas.
Desde 2013, o Ministério do Turismo e o Instituto Chico Mendes (ICMBio), órgão do Ministério do Meio Ambiente que gerencia os parques, realizam em 12 deles ações de integração com o entorno, em parceria com o Sebrae. "Temos áreas protegidas que não conseguimos converter em frutos turísticos. Precisamos abrir para o investimento privado, aumentar o fluxo de visitantes, mas manter o processo de proteção", diz o ministro do Turismo, Vinicius Lages.
Para Sergio Brant, diretor de criação e manejo de unidades de conservação do ICMBio, as iniciativas de concessões nos moldes dos parques da Tijuca, Iguaçu e Fernando de Noronha - geridas pelo mesmo grupo - são referências, mas é preciso incentivar investidores menores. "O que estamos desenvolvendo são cooperações que se adaptem a parques de todos os tamanhos", explica.

CENTRO-OESTE
O fim da obrigatoriedade da contratação de guias para visita ao Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros ajuda a explicar os 39 mil visitantes em 2014, quase 10 mil a mais do que em 2013. Pode parecer pouco para um parque tão próximo a Brasília e considerado uma espécie de praia para os moradores da cidade. Entretanto, um aumento de 30% é significativo e a tendência é que siga em ascensão, já que em outubro foi concluída a obra de asfaltamento da rodovia que leva à Vila de São Jorge, principal porta de entrada para a chapada. Só nos primeiros 18 dias deste ano, foram 5 mil visitantes. Dentro do parque, destaque para a construção de um banheiro seco no camping da travessia das Sete Quedas e para a reforma da principal ponte que dá acesso à Trilha dos Cânions. Além da construção de uma escada, que facilitou a chegada à Cachoeira das Cariocas.

NORTE
Uma das joias que têm justificado a merecida fama de Alter do Chão como destino de praias fluviais em meio à selva amazônica é a vizinha Floresta Nacional do Tapajós. Para continuar atraindo visitantes à região, ganhou trilha com sinalização interpretativa, um abrigo para piquenique e maior controle de acesso de visitantes. Além disso, as trilhas da Selva do Curupira e da Serra do Gato devem receber melhorias em breve.

NORDESTE
Ainda pouco conhecido pelos viajantes, o Parque Nacional da Serra das Confusões, no sudeste do Piauí, começa a se tornar mais acessível. Vizinho do já consagrado e bem estruturado parque da Serra da Capivara, famoso por ter a maior concentração de pinturas rupestres do planeta, a reserva acaba de inaugurar um centro de visitantes com exposição interpretativa de achados arqueológicos e imagens da região, além de auditório e lanchonete.
Já o Parque Nacional dos Lençóis Maranhenses, famoso por seu deserto de dunas polvilhadas por lagoas cristalinas, também recebeu melhoria. Foi instalada uma ponte para acesso de visitantes à Lagoa Azul, a mais visitada, com água o ano todo. Contudo, a melhor época para visitar a região é entre junho e setembro, quando as chuvas se encarregam de encher centenas de outras lagoas.

SUDESTE
Ficam na região Sudeste as duas últimas reservas a ganhar status de parque nacional, no fim de 2014: o do Guaricana, na Mata Atlântica do litoral paranaense, e o da Serra do Gandarela, nos arredores de Belo Horizonte. Além deles, outros têm novidades, como o Parque Nacional da Serra do Cipó (MG), que ganhou mirantes em áreas estratégicas de visitação e ainda deve receber sanitários e pontes para pedestres. Já o Parque Nacional do Itatiaia, na divisa entre Minas e o Estado do Rio, recebe reformas em estruturas como o Abrigo Rebouças, que terá ao seu lado um camping com banheiros. Na parte baixa, serão reformados o centro de visitantes e a lanchonete do Lago Azul. Por sua vez, o Parque da Tijuca se prepara para a Olimpíada de 2016, com projetos de um novo sistema de transporte interno por jardineiras, a fim de aliviar o trânsito, melhoria nas ciclofaixas e regulamentação da operação de food trucks dentro do parque.

SUL
Mais estruturado dentre os parques nacionais, o do Iguaçu ganhará, ainda no primeiro semestre de 2015, uma ciclovia ligando o centro de visitantes às cataratas. E também uma estrutura que permitirá acesso de deficientes ao Macuco Safári, os barcos velozes que chegam pertinho das quedas. Por sua vez, os parques de Aparados da Serra e de Serra Geral, na divisa entre Rio Grande do Sul e Santa Catarina, ganharão, em abril, nova trilha na borda do Cânion Fortaleza.


Infraestrutura e mudança cultural, um desafio
Apesar do aumento na visitação dos parques nacionais brasileiros, o número ainda é muito baixo em comparação a outros países. Segundo Ana Luisa da Riva, do Instituto Semeia, a média de visitação no Brasil é de 1,1 visitante por hectare, enquanto nos Estados Unidos é de 10,8 e, na Austrália, de 4,6. "Temos potencial de ter turismo mais expressivo", diz.
Evandro Schültz, presidente da Associação Brasileira das Empresas de Ecoturismo e Turismo de Aventura (Abeta), tem opinião semelhante. "O Brasil ainda não se descobriu, turisticamente falando. É bom conhecer o modelo de parques americanos, argentinos e chilenos para buscarmos a nossa própria visão", defende.
Falta de infraestrutura dos parques e difícil acesso estão entre as razões da baixa visitação, mas, para Paula Arantes, consultora em ecoturismo e organizadora do Fórum Interamericano de Turismo Sustentável, há também um fator cultural. Segundo ela, a ideia de interagir com a natureza no Brasil está muito associada ao litoral. "Por que na Europa e nos Estados Unidos viver ao ar livre é algo tão natural e aqui não? Por que só se pensa em lazer na praia e não na cachoeira?", questiona.
O ministro do Turismo, Vinicius Lages, defende que os parques ampliem as opções de interação. "Atividades como arvorismo e balonismo, por exemplo, tornam a visita mais atrativa", afirma. "Você pode enriquecer a experiência nos parques. Só a natureza pura pode ser pouco."

OESP, 24/02/2015, Viagem, p. D4

http://viagem.estadao.com.br/noticias/geral,parques-nacionais-com-folego-para-mais,1638331
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