Ilhabela cobrou IPTU em reserva

OESP, Metrópole, p. C1 - 25/03/2005
Ilhabela cobrou IPTU em reserva
Muitas pessoas que adquiriram lotes das décadas de 50 a 70 não sabem até hoje que eles estão em área de parque estadual criado em 77

Luciana Garbin

A confusão fundiária em Ilhabela é tanta que, enquanto imobiliárias negociam terrenos dentro de áreas de preservação, milhares de proprietários nem sabem que perderam terras adquiridas bem antes da criação do Parque Estadual, em 1977. Ou acabaram descobrindo muitos anos depois. Por décadas, pagaram IPTU para a prefeitura sem saber que já haviam perdido a posse dos lotes.
Só em 1996 a prefeitura da ilha mandou excluir do cadastro informações de cerca de 17 mil lotes localizados dentro da reserva. Em 1997, os carnês pararam de chegar aos contribuintes. Mas nesse ano prescrevia o prazo para que donos desses lotes entrassem com pedidos de indenização.
Uma proprietária que pediu para não ser identificada conta, por exemplo, que comprou no fim dos anos 50 dois lotes no Jardim Costa Azul e dois no Sítio dos Sinos. Sabia que ficavam em área de difícil acesso, mas pensava num investimento de futuro e pagou impostos até 1996. No ano seguinte, não recebeu mais carnês do IPTU e foi à prefeitura. Soube que a área havia sido desapropriada. "A prefeitura nunca nos informou sobre a criação do parque e continuou cobrando impostos", reclama. Ela diz que na época soube que parte da ilha havia virado reserva, mas não se preocupou, pois tinha contrato de compra dos lotes e pagava IPTU. "Isso é uma vergonha", diz.
Quem também comprou lotes, mas no Condomínio Murupiara, foi o ex-governador Laudo Natel. Um para ele e um para cada um dos dois filhos. Segundo sua secretária, Suely Salete Paes, até ontem a família não sabia que tinha perdido direito sobre os lotes, adquiridos há cerca de 30 anos. Com a morte da mulher do ex-governador, Maria Zilda, há dois anos, eles decidiram contratar um advogado para devolvê-los à prefeitura, porque, como não tinham escritura, não entrariam no inventário. "Eles compraram de um conhecido na planta e tinham apenas Instrumento Particular de Compromisso de Venda e Compra de Fração de Imóvel." Segundo Suely, Natel continuou pagando IPTU até recentemente e os filhos até o fim dos anos 90.
O secretário de Assuntos Jurídicos de Ilhabela, Odair Barbosa dos Santos, indicado pelo prefeito Manoel Marcos de Jesus Ferreira (PTB) para falar do assunto, confirma que milhares de dados de lotes na área do parque foram apagados do arquivo da prefeitura. Em 1996, ele era procurador do município e diz que a data foi escolhida porque já em 1997 venceria o prazo de 20 anos para que as pessoas entrassem com ações contra o Estado e a arrecadação do IPTU já não compensava gastos com cobrança. Após cinco anos, diz que também prescreveu o prazo para ações contra a prefeitura. E por que continuaram cobrando impostos, sabendo que os lotes tinham virado parque? "Porque eles perderam a posse, não o domínio. Continuam donos dos lotes, mas, se entrarem e cortarem um galhinho, serão autuados."
ARQUIVO MORTO
A ex-prefeita Nilce Signorini (PDT), que assumiu o cargo em janeiro de 1997, diz que a ordem para que os dados fossem para o arquivo morto foi dada um ano antes, na gestão do então prefeito Roberto Fazzini (PMDB), que já tinha administrado a cidade duas vezes (1973-1976 e 1993-1996) e hoje é secretário de Governo de Manoel Marcos. Ela destaca que nesse ano também foi criada uma associação de vítimas, para acionar o Estado. A maioria perdeu, porque tinha apenas títulos de posse.
Para Fazzini, o maior culpado é o Estado que, ao decretar o parque, deveria ter chamado os donos dos lotes, demarcado as áreas, promovido as indenizações. Diz que a própria prefeitura entrou com ação indenizatória, mas perdeu. "Na época, Ilhabela nem tinha equipe técnica para mapear a área e definir os lotes que estavam ou não no parque. Se tivesse tirado imediatamente do cadastro, a prefeitura estaria usurpando o direito dos proprietários."

Caravana contra corrupção fará na 3.ª eventos na ilha
Ilhabela vai ser o primeiro município brasileiro a receber uma caravana contra a corrupção promovida por auditores fiscais. Será nesta terça-feira. Batizada de Todos Contra a Corrupção, a caravana é promovida pelo projeto Adote um Município, criado para reforçar ações de ONGs contra a corrupção, conscientizar cidadãos e mostrar a autoridades locais que há pessoas atentas aos gastos públicos. Em cada município, eles farão uma audiência à tarde com vereadores na Câmara Municipal e outra à noite com a sociedade civil. Participarão representantes de oito entidades ligadas ao funcionalismo público que trabalha no controle de contas públicas, como a União dos Auditores Federais de Controle Externo (Auditar). Depois de Ilhabela, a caravana seguirá para Bertioga, na quarta-feira, e Cananéia, na quinta. L.G.

OESP, 25/03/2005, Metrópole, p. C1
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