Oleo foi espalhado por erro, diz prefeitura

FSP, Cotidiano, p.C10 - 29/04/2005
Relatório afirma que limpeza de manilha feita pela empresa FCA facilitou chegada do diesel ao rio, em Itaboraí
Óleo foi espalhado por erro, diz prefeitura
Sergio Torres
Enviado especial a Itaboraí (RJ)
Um procedimento errado da FCA (Ferrovia Centro-Atlântica) -empresa cuja acionista majoritária é a Companhia Vale do Rio Doce- facilitou o escoamento do óleo diesel para o rio Caceribu, para a área de proteção ambiental de Guapimirim e para a baía de Guanabara, acusa relatório que será encaminhado ao Ministério Público Federal pela Prefeitura de Itaboraí (cidade a 45 km do Rio).
Quando o diesel vazou após o descarrilamento de vagões-tanque da FCA no distrito de Porto das Caixas, terça de madrugada, a companhia colocou seis trabalhadores para limpar a entrada de uma manilha de canalização fluvial que passa ao lado da ferrovia. Com isso, o diesel entrou pela manilha e chegou ao rio facilmente.
O subsecretário de Meio Ambiente de Itaboraí, Heleno Cruz, disse que a tubulação estava praticamente entupida por mato e lixo. Quando a FCA fez a limpeza, o óleo empoçado junto aos trilhos passou a escorrer para a manilha, que deságua no rio Porto das Caixas, afluente do Caceribu. Cruz calcula que, por ao menos três horas, o óleo escorreu pela manilha, cujo diâmetro tem cerca de 60 cm.
A manilha só foi entupida de terra após as 10h, por ordem do subsecretário, cerca de seis horas após o início do vazamento.
A juíza Perla Lourenço Corrêa, da Comarca de Itaboraí, sentenciou ontem a FCA a recompor os danos ambientais causados na cidade pelo derramamento. A Justiça deu prazo de 48 horas para a empresa retirar o óleo, evitar seu avanço e dar abrigo aos desabrigados. O não-cumprimento implica multa de R$ 100 mil por dia.
A FCA já recebeu duas multas: R$ 10 milhões pela Comissão Estadual de Controle Ambiental pelo derramamento e de R$ 1 milhão pela Serla (Superintendência Estadual de Rios e Lagos), porque um manancial de abastecimento hídrico foi atingido.
A quantidade de óleo derramado ainda é desconhecida. A FCA fala em 60 mil litros. O Ibama (instituto ambiental do Brasil), a Feema (Fundação Estadual de Engenharia do Meio Ambiente) e a Prefeitura de Itaboraí estimam até 100 mil litros vazados.
Os cerca de 150 técnicos e operários envolvidos no trabalho não conseguiram ontem evitar que manchas de óleo alcançassem os manguezais da APA, última área preservada da baía. Para piorar, uma barreira de contenção se rompeu ao amanhecer, por causa da correnteza, entre os rios Caceribu e Guaraí. Até o início da tarde os técnicos não haviam remontado a barreira.

Saiba mais
Privatização deu origem à maior ferrovia do país
Privatizada há nove anos, a Ferrovia Centro-Atlântica (FCA) é uma concessionária do transporte ferroviário de cargas. A acionista majoritária é a Companhia Vale do Rio Doce, com 99,9% das ações da empresa.
A FCA é a maior ferrovia do país em extensão. A empresa é responsável pela operação de uma malha que atinge 7.840 km em sete Estados e também o Distrito Federal. A frota atual da empresa é composta de cerca de 10 mil vagões e 400 locomotivas.

Outro lado
Empresa diz que tentou conter vazamento
O presidente da FCA, Mauro Dias, disse ontem que a empresa tomou as providências necessárias para conter o vazamento. Ele culpou a chuva pelas dificuldades para conter o óleo que vazou dos vagões.
Na companhia do presidente, o gerente de operações da FCA, André Oliveira, disse que a empresa providenciou, ao amanhecer de terça, a obstrução da manilha de escoamento pluvial ao lado da linha férrea.
"Às 8h, estavam todos mobilizados", disse Dias, para quem "agora não cabe ficar discutindo o que aconteceu, procurando culpados". Segundo a Defesa Civil da Prefeitura de Itaboraí, o acidente ocorreu às 4h18.
Ele admitiu que a empresa não tinha a licença ambiental do Ibama, exigida por lei.
Segundo Dias, todas as empresas ferroviárias foram privatizadas em 1996 sem as licenças ambientais. "Isso está sendo regularizado com o Ibama."
Dias afirmou que as famílias da região receberão cestas básicas enquanto a pesca estiver proibida e que os pescadores poderão ser contratados para ajudar na limpeza da APA.

Ibama proíbe pesca por dez dias
O Ibama (instituto nacional do meio ambiente) proibiu por ao menos dez dias a pesca na APA (Área de Proteção Ambiental) de Guapimirim por causa do derramamento de óleo diesel, ocorrido na terça. O objetivo é evitar que peixes, crustáceos e moluscos que tenham tido contato com o óleo sejam ingeridos pelas pessoas.
Com a maré alta, o óleo se espalhou pelo manguezal, o que, para os técnicos do Ibama, da Feema (fundação estadual de meio ambiente) e da Serla (Superintendência Estadual de Rios e Lagoas), torna a situação mais delicada. Para a coordenadora de Educação Ambiental da Serla, Verônica Castro, os efeitos do óleo nos peixes começarão a ser sentidos hoje.
Cerca de 80 famílias vivem da pesca na área da APA. Segundo a colônia de pescadores Z-8, a produção diária da região é de cerca de quatro toneladas de pescados.
O pescador Barnabé Almeida, 33, passou os dois últimos dias na margem do rio Caceribu para observar o trabalho de contenção do óleo. Almeida diz que, sem a pesca, não terá como manter a mulher e os filhos, de 1 e 8 anos. "Fico aqui porque tenho a esperança de liberarem a pesca logo."
O pescador lamenta o fato de não ter sido ainda procurado pela FCA, pela prefeitura ou pelo Ibama. "Estamos abandonados. Só disseram que é proibido pescar."

FSP, 29/04/2004, p. C10
UC:APA

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