Arte dá sustentabilidade

Página 20 - 16/10/2007
Pelo de um menos 60 famílias vivem na área do seringal São Francisco dentro da Reserva Extrativista Chico Mendes, 35 quilômetros acima de Assis Brasil, já quase na fronteira com o Peru, onde os rios Acre e Iaco tem suas nascentes. Mas, desestimulados pelo isolamento e baixo preço da borracha, só oito delas reabriram suas estradas.

Um deles é José Rodrigues de Araújo, mais conhecido como Dotorzinho, morador da colocação Cumaru I. O apelido vem pela curiosidade inventiva que sempre demonstrou desde a infância e que, por isso mesmo, surpreende a maioria das pessoas, como fez durante a I Panamazônia, quando apresentou bandeiras do Acre e do Brasil feitas de borracha natural.

A idéia surgiu depois que ele participou de um treinamento para aprender a fazer a folha defumada líquida (FDL), que permite que o quilo da borracha prensada, cujo preço pago aos seringueiros do São Francisco está na faixa de R$ 1,80, suba para R$ 4 o quilo quando transformada em FDL . A melhora no preço foi que animou a ele e mais sete famílias de seringueiros a reabrirem suas estradas para extração do látex.

Comecei a produzir as folhas defumadas e quando me chamaram para uma reunião em Assis Brasil levei os quilos que estavam prontos para vender e assim pagar a viagem. Lá encontrei uma moça de São Paulo que gostou das folhas e me perguntou por que eu não fazia bolsas com aquele material. Quando cheguei em casa fiz uma porção delas em vários modelos e arriatas de todo tamanho, nesse tempo passou por aqui a turma do Projeto Rondom, comprou todas as bolsas e um deles perguntou se eu não fazia sapatos de borracha. Disse que nunca tinha feito, mas iria experimentar. Desde aquele dia não dei mais conta das encomendas, relata.

Exceto pelos sapatos e pequenos objetos como chaveiros, bandeiras e peças utilitárias expostas por Dotorzinho durante a Panamazônia, toda sua produção tem sido vendida em Assis Brasil, de onde a cada viagem traz nova lista de encomendas para atender.

Inventei de tingir borracha e aí é que o pessoal gostou mesmo. Como já não dou conta das encomendas, meu filho se animou com o negócio e outros dois vizinhos se interessaram em aprender o serviço. Por isso estou ensinando para eles porque a vida no seringal não está fácil e tem espaço para todo mundo ganhar dinheiro com esse trabalho, garante.

Ampliação de mercado
Quanto aos resultados da Panamazônia ele se anima em dizer que: Fora de Assis Brasil ninguém conhecia meu trabalho, mas a feira me ajudou muito porque peguei várias encomendas de lojas de Rio Branco e de outros estados como São Paulo e Brasília, agora eu tenho de garantir a produção porque eles me disseram que se o produto aprovar eles vão precisar de muitas peças, daí tenho que dar um jeito de aproveitar a oportunidade.

A feira promovida pelo governo do Estado em parceria com a prefeitura, Sebrae e entidades não governamentais serviu de escola para Dotorzinho que, desde o princípio sempre prestou muita atenção no que dizem seus clientes. Lá eu aprendi que o pessoal gosta de tudo o que faço, mas tem preferência pelas miniaturas de sapato, bandeiras, folhas e bichinhos da mata, mas não gostam dos chaveiros de ferro que eu estava usando, por isso inventei outros tipos de arriatas feitos com envira de malva e de bofe de anta porque fibra de buriti a gente não tem por aqui. Eles querem tudo feito da de coisa da mata, bem natural.

Sustentabilidade à seringueira
Dotorzinho lembra que as seringueiras nativas que ainda restam na mata já não produzem tanto quanto as de antigamente e, que há hoje menos árvores do que naqueles tempos, então é preciso valorizar ainda mais o látex que consegue. Sua colocação tem três estradas que juntas somam cera de 350 seringueiras. De cada estrada consegue extrair uma média de 20 litros por dia. Essa quantidade é suficiente para produzir cerca de dez quilos de borracha prensada que lhe renderiam menos de R$ 20 diários, ou quase R$ 40 em folha fumada, mas com o feitio dos objetos trabalhados seu resultado é bem melhor.

Gasto uma média de 400 a 500 gramas de borracha seca para produzir um par de sapatos para adulto, vendo ele a R$ 20 cada um, então consigo tirar uma renda de mais ou menos R$ 40 por quilo de borracha. Por isso hoje eu só faço folha defumada com a borracha que sobra do meu serviço com os objetos. Acredito que o pessoal só vai valorizar e proteger tudo o que tem na mata quando ela der dinheiro pro bolso da gente, do contrário o pessoal vai continuar desmatando, adverte.
UC:Reserva Extrativista

Unidades de Conservação relacionadas

  • UC Chico Mendes
  •  

    As notícias publicadas neste site são pesquisadas diariamente em diferentes fontes e transcritas tal qual apresentadas em seu canal de origem. O Instituto Socioambiental não se responsabiliza pelas opiniões ou erros publicados nestes textos. Caso você encontre alguma inconsistência nas notícias, por favor, entre em contato diretamente com a fonte.