Floresta gera riqueza no ciclo sustentável da Amazônia - Parte III

Kaxi ANA - Agência de Notícias da Amazônia - 06/02/2008
O boom econômico que vem do manejo sustentável das riquezas da floresta, tanto no seringal Cachoeira quanto em outras áreas extrativistas da Reserva Chico Mendes, está definitivamente animando as pessoas e fazendo circular mais dinheiro nas praças de Xapuri, Brasiléia e outras localidades menores da região do Vale do Acre.

"Percebo que a população está bastante animada. A gente vê o otimismo nos olhos das pessoas", diz o gerente do Banco do Brasil de Xapuri, Fernando de Oliveira Júnior, ao revelar que só no município, nos últimos três anos, a instituição investiu mais de R$ 3 milhões em empréstimos para pessoas jurídicas, que buscam o dinheiro principalmente para capital de giro, aquele a que os empresários mais recorrem para ampliar suas atividades. O BB também está investindo em projetos sustentáveis de produção de borracha, de castanha, de madeira, de animais silvestres e até de ecoturismo, devido ao potencial que a região de floresta representa para o país e o mundo.

No caso dos empréstimos de Xapuri, há um detalhe importante que o gerente revela em primeira mão: o percentual de inadimplência nos pagamentos dos empréstimos de sua agência tem sido zero, contra a média de 3% registrada nacionalmente pelo banco. "É quase inacreditável, mas nossa taxa de inadimplência com relação aos empréstimos em Xapuri é zero. Isso significa que as pessoas estão acreditando no potencial econômico da região e os empresários, passando a investir mais no município", relata o gerente do BB. Segundo ele, os dois investimentos fortes no município (fábricas de camisinha e de tacos) "estão fazendo as pessoas acreditarem mais no futuro e podem ser a redenção econômica da região".

Só a fábrica de camisinhas, que custou R$ 30 milhões ao governo federal, em parceria com o governo do Estado, está comprando a R$ 3,40 o quilo da borracha seca produzida por 700 famílias de seringueiros da reserva extrativista Chico Mendes. No auge do funcionamento, a fábrica vai gerar 150 empregos diretos, consumir 500 toneladas de látex in natura por ano e produzir anualmente 100 milhões de preservativos, reduzindo a necessidade de importação quase total que o país tem hoje em relação a esse produto.

Por sua vez, a fábrica de tacos e decks, que custou cerca de R$ 35 milhões, financiados pelo governo do Estado junto ao BNDES, também vai gerar cerca de 150 empregos diretos e consumirá, preferencialmente, a produção comunitária de madeira manejada por mais de 600 seringueiros da Reserva Extrativista Chico Mendes, inclusive no Cachoeira.

O gerente do Banco do Brasil revela que há seringueiros hoje procurando o banco para abrir conta corrente e saber das linhas de crédito que a instituição oferece por meio de seu programa de Desenvolvimento Regional Sustentável (DRS). O BB também está trabalhando com recursos do Programa de Agricultura Familiar (Pronaf) no âmbito da fábrica de camisinhas e de tacos.

Para o gerente, dinheiro para ampliar a economia da região não é problema, mas o que falta ainda são projetos e assistência técnica. "Dinheiro não falta no Banco do Brasil. Aqui em Xapuri, sobra dinheiro. O que falta são projetos e assistência técnica", diz ele, ao revelar que só de recursos para assentamento de produtores rurais nos projetos do Incra existe hoje uma oferta de mais de R$ 4 milhões.

Novo processo industrial valoriza e aposta na floresta

"O que se vê hoje no seringal Cachoeira é o início do quarto ciclo econômico da Amazônia, que é o do desenvolvimento sustentável", diz o historiador Marcos Vinicius das Neves, presidente da Fundação Cultural Garibaldi Brasil, de Rio Branco, fazendo fé para que a nova fase, que implica a manutenção e valorização da floresta, não perca espaço para a pecuária, que ainda é, segundo o historiador, muito forte tanto no Acre quanto no resto da Amazônia.

O historiador explica que o quarto ciclo econômico da região de maior floresta tropical do planeta sucedeu o ciclo da pecuária, iniciado na década de 1970, quando, com a ajuda dos governos federal e estaduais e dinheiro do Banco do Amazônia, essa atividade quase sufocou o extrativismo da borracha, que hoje é ainda a base mais forte do manejo de uso múltiplo florestal que inicia o quarto ciclo presente no seringal Cachoeira. O segundo ciclo econômico, segundo Marcos Vinicius, deu-se durante a II Guerra Mundial, que permitiu fortalecer o extrativismo da borracha para ele enfrentar e conseguir sair vivo do massacre da pecuária em cima dos seringueiros e da floresta. O primeiro ciclo econômico da região remonta à época da Revolução Industrial, quando a borracha surgiu como âncora para a diversificação e o consumo dos produtos no mundo.

Para o ex-governador Jorge Viana, em cujo governo de oito anos se valorizaram a borracha, a castanha, a madeira e se conceberam justamente projetos estratégicos para o quarto ciclo econômico que se inicia agora na Amazônia, os povos da floresta merecem viver esse novo ciclo econômico e social porque foram seus maiores guardiões ao longo da história”. O governador Binho Marques está dando seqüência à estratégia do desenvolvimento sustentável que vem sendo empreendida no Estado de acordo com os ideais de sustentabilidade defendidos por Chico Mendes.

Para idealizar e pôr em prática o propalado conceito de florestania (cidadania na floresta), os governos da Frente Popular do Acre contam com a colaboração direta de outras personalidades de proa da política acreana, como os senadores Tião Viana e Marina Silva (hoje ministra do Meio Ambiente), que demonstram, com muita competência, ao cenário político nacional a importância e a estratégia de desenvolver a Amazônia de forma sustentável para o bem do clima e da humanidade. "Esperamos que esse quarto ciclo econômico resulte em breve em não termos de derrubar mais nenhuma árvore em nosso Estado e em toda a Amazônia", apregoa Tião Viana, ex-presidente e atual vice-presidente do Senado Federal. A grande maioria das bancadas federal e estadual do Acre também comunga com os mesmos ideais de sustentabilidade da floresta.

Outra figura de grande importância para o surgimento do novo boom florestal do Estado foi o engenheiro Gilberto Siqueira, que há nove anos planeja e gerencia o crescimento da economia acreana em bases absolutamente sustentáveis. Como secretário de Planejamento e Gestão, Siqueira e sua apurada equipe de economistas, engenheiros, arquitetos e profissionais de diversas outras áreas vêm fazendo ao longo de todo esse tempo a ponte executiva com Brasília, o Brasil e o mundo para o Acre continuar despontando como principal modelo de desenvolvimento sustentável para toda a Amazônia.

"O início desse quarto ciclo econômico da Amazônia aqui no Acre mostra o potencial efetivo da floresta. Mostra também que, se houver oportunidades e desenvolvimento tecnológico, a floresta pode gerar muitas riquezas", diz Siqueira. Para ele, "o desenvolvimento sustentável é um pêndulo que ganha sinergia na medida em que agrega a todos e contempla o passado, o presente e o futuro".

Gilberto Siqueira também faz questão de frisar que os seringueiros e outros povos da floresta entram no quarto ciclo da economia amazônica integrados a um processo industrial novo, que valoriza a floresta. "Esse processo mostra ao Brasil, que sempre desprezou a floresta, que é possível fazer uma economia forte, limpa, saudável, que pode incluir produtos de futuro, como são os fármacos", completa. Além da biotecnologia, o secretário também aposta no biomimetismo, que são as diferentes formas da natureza, onde se pode, por exemplo, segundo ele, "desenhar um grande avião copiando a anatomia de um grande inseto da floresta".

Ciclo atende os ideais de Chico Mendes

Pelo que vimos na presente reportagem, a semente do quarto ciclo econômico da Amazônia está definitivamente instalada na terra de Chico Mendes e ela foi plantada exatamente da forma pela qual o ecologista tanto lutou e sonhou: incluindo o seu povo da floresta.

"O Chico ingressou na luta para mudar a situação do homem da floresta", diz o seringueiro Duda Mendes, o personagem que foi aleatoriamente escolhido para que, conhecendo sua casa, bebendo a água limpa da floresta no bebedouro elétrico de sua cozinha e conversando algumas horas em sua varanda, pudéssemos reportar a quantas andam, de fato, os verdadeiros e seculares guardiões da floresta, que o mundo quer e tanto precisa ver conservada para o bem das futuras gerações e da vida na Terra.
UC:Reserva Extrativista

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