Fechado para o público há exatos nove meses, o Parque Nacional da Chapada dos Guimarães (MT) começou a registrar presenças ilustres e dificilmente apreciadas em meio à visitação descontrolada, que por anos marcou a unidade de conservação. Agora, no lugar dos turistas, voltaram a aparecer lobos-guará, emas, veados, cotias, antas, tatus, tamanduás, onças e uma infinidade de aves. Em quase 20 anos de parque, nunca seu cartão postal - a cachoeira Véu da Noiva - e a sequencia de sete quedas dágua próximas à entrada, ficaram tanto tempo interditadas. "Começamos a perceber uma presença maior desses animais a partir de outubro do ano passado. Aqui no entorno da sede, sempre passava uma anta no fim do dia. Agora, essas visitas estão mais frequentes", relata Cecílio Vilabarde Pinheiro, chefe da unidade de conservação.
Mas se são visíveis fezes e pegadas de animais nos principais acessos às atrações, é também facílimo encontrar, nesses mesmos locais, marcas de sapatos, bicicletas e motociletas, ignorando os avisos do parque sobre a proibição temporária para o ingresso de pessoas em seus limites. Cavaletes, correntes e placas na estrada que dá acesso à portaria informam que a unidade segue fechada, sem data para abrir. Mas nem de longe são suficientes para segurar a pressão por banhos de cachoeira e lazer vindos, sobretudo, da capital mato-grossense. Cuiabá é um dos lugares mais quentes do Brasil, a apenas 50 quilômetros.
"Chapada deixou de ser um polo nacional de ecoturismo para se tornar um polo regional de lazer. Fechado, o parque é ainda mais depredado", avalia o guia Noam Salzstein. Ele conta que as pessoas não deixaram de frequentar a área. A diferença é que, agora, se concentram em pontos menos sujeitos à fiscalização, podendo prejudicar outras regiões sensíveis da unidade de conservação.
O Parque Nacional da Chapada dos Guimarães teve suas principais atrações fechadas depois que um bloco rochoso se desprendeu de um paredão, em abril de 2008, matando uma adolescente e ferindo dezenas de pessoas que tomavam banho no poço da cachoeira Véu da Noiva. "Por similaridade, a visitação no Véu da Noiva e na Cidade de Pedra está fechada por questão de segurança. Quem adentra esses lugares está colocando a vida em risco", alerta o chefe Pinheiro. Ele explica que a pesquisa científica prossegue normalmente e outras áreas não cercadas por paredões continuam abertas, como a Água Fria, as nascentes do rio Mutuca e o rio Claro.
Mesmo assim, não dá para evitar a decepção dos visitantes ao serem impedidos de entrar, ainda mais quando eles têm sido amplamente incentivados pelo município e pelo estado. Em dezembro passado, por exemplo, o governo estadual divulgou precipitadamente que o parque seria aberto antes do Natal. Mas não abriu e os visitantes se frustraram. Indagada sobre por que a Secretaria de Desenvolvimento do Turismo de Mato Grosso (Sedtur) agiu desta maneira, sua assessoria de imprensa respondeu que "o secretário [Yuri Alexey Vieira Jorge] considerou que as obras já estariam prontas".
Segundo gestores do Instituto Chico Mendes no parque, apenas 20% das melhorias de infraestrutura necessárias para a abertura definitiva da unidade de conservação foram feitos até agora. Os outros 80% dependem, sobretudo, de recursos prometidos pelo próprio estado. O dinheiro servirá para construir anteparos permanentes nas trilhas, calçamento para evitar contato com áreas frágeis, avaliação de capacidade de carga e, inclusive, redesenho de alguns acessos para que os caminhos sejam mais seguros para os visitantes e menos prejudiciais à conservação. "Não passamos esse tempo todo fechados para o parque continuar a mesma coisa. Uma morte aconteceu. Isso é mais do que uma fatalidade", considera Pinheiro.
A Sedtur prometeu nada menos que 10 milhões de reais. Mas pelas respostas que deu a perguntas básicas sobre liberação do dinheiro, sua aplicação e estudos sérios sobre turismo na região, parece até que foi da boca para fora. Mas não foi. O interesse declarado de Mato Grosso em se tornar uma das cidades-sede de Copa do Mundo e de abrir o parque às concessões privadas de grande porte, como para construção de tirolesas e teleféricos, não sai da cabeça nem do discurso das autoridades. Confira aqui as outras respostas oficiais da Sedtur.
"Eles mapearam o parque, escolheram as áreas mais economicamente relevantes e vão entregar para a iniciativa privada. Nada contra o teleférico, que se instalado em áreas frágeis poderia levar o turista sem a degradação de estradas e carros, mas falta conversar com a comunidade, que foi alijada de todo esse processo", opina o guia Noam Salzstein.
Segundo o Instituto Chico Mendes, as regras definitivas sobre visitação, conservação e acessibilidade serão conhecidas quando, afinal, for concluído o plano de manejo do parque, marcado para seu 20o aniversário, em 12 de abril. "Esta é a nossa maior prioridade", diz Pinheiro. Mas enquanto a referência não fica pronta, sobram críticas à fiscalização do restante do parque. "Tem gente acampando na beira de rio, fazendo churrasco, ouvindo música no último volume, pescando lambari e vendendo na beira da estrada, coletando pequi e faturando mil reais por semana às custas do parque. Se querem fechar, têm que fiscalizar. Senão não adianta nada", critica o guia Salzstein.
Ele lamenta a interdição do parque a quem o procura para praticar ecoturismo de baixo impacto. "Eu não posso tirar uma mangaba do pé para mostrar ao turista que nunca viu a fruta de Cerrado, mas quem quer bagunça pode". Por essas e outras ele diz que está deixando de guiar na Chapada para se dedicar apenas ao Pantanal.
A administração do parque informou que está em ritmo acelerado para concluir estruturas provisórias e abrir exclusivamente o acesso à cachoeira Véu da Noiva nos próximos dias. Quem visitar esta área do parque percorrerá uma nova trilha, de 200 metros, da portaria até o mirante, menos íngreme e com vista para os paredões. A expectativa é de que também haja gente cedida pelo estado e pelo município para ajudar no monitoramento. E que daqui para frente, mesmo com as novas regras e acessos, a fauna volte a frequentar, ao menos dentro da unidade de conservação, seu espaço original.
Serviço:
Sede do Parque Nacional da Chapada dos Guimarães
(65) 3301-1133
UC:Parque
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