Pouca verba para o verde

O Globo, Rio, p. 14 - 15/10/2009
Pouca verba para o verde
Fundo ambiental destina só 0,4% de recursos para unidades de conservação

Fábio Vasconcellos

No papel, trata-se de uma área de proteção ambiental, criada por decreto em 1974. Mas, ao entrar no Parque Estadual Maciço da Pedra Branca, em Vargem Grande, a realidade é bem diferente. É fácil perceber como o local sofre com a degradação e a falta de fiscalização. A situação do parque, o maior da cidade, com 12 mil hectares, é explicada pelos números. O Instituto Estadual de Florestas (IEF), responsável pela manutenção de 13 das 26 unidades de conservação do Rio, recebeu, em 2008, apenas 0,4% (R$ 1,4 milhão) de recursos do Fundo Estadual de Conservação Ambiental e Desenvolvimento Urbano (Fecam).

O fundo é um dos principais mecanismos do governo para destinar verbas às ações ambientais, mas suas receitas são disputadas por outras secretarias e empresas do estado. Apesar da ampliação em 2008 dos repasses do Fecam para o IEF - em 2007, foram destinados apenas R$ 375 mil (0,18%) -, o relatório de despesas do fundo mostra que os recursos têm sido investidos mais em projetos de recuperação ambiental realizados por outros órgãos, como saneamento e redução de poluição, do que em preservação do ambiente natural.

Logo na entrada do parque pela Estrada do Sacarrão, em Vargem Grande, além de lixo e ligações clandestinas de energia elétrica, é possível encontrar novas casas construídas.

Uma delas tem dois andares e está, segundo a Comissão de Meio Ambiente da Alerj, dentro dos limites do parque.

Num outro imóvel, o morador começou a derrubar a vegetação para ampliar os cômodos, tendo já instalado tapumes. A Secretaria do Ambiente desconhece as novas construções, mas mandará um equipe ao local
Ampliação do metrô levou 7,3% da verba
Enquanto o IEF, este ano incorporado ao Instituto Estadual do Ambiente (Inea), ficou com menos de 0,5% dos recursos do Fecam, a Cedae não teve do que reclamar. A empresa recebeu 36% das verbas do fundo (R$ 115 milhões) para projetos de saneamento. Em 2008, o Fecam arrecadou R$ 322 milhões, a maior parte de repasses de royalties de petróleo.

Acima do IEF ficou também a RioTrilhos e a Secretaria de Obras.

Esta recebeu 13% de recursos, enquanto outros 7,3% foram para a ampliação das linhas 1 e 2 do metrô.

O modelo de aplicação de recursos do Fecam não conta com unanimidade.

O promotor de Tutela Coletiva de Defesa do Meio Ambiente da capital, Carlos Frederico Saturnino de Oliveira, afirma que é necessário discutir o uso da verba, especialmente quando ela é direcionada a órgãos e empresas que podem ter outras fontes de recursos, como Cedae e RioTrilhos.

- A lei não proíbe a aplicação de recursos do Fecam em projetos de saneamento e transporte mais limpo, que de fato têm impacto positivo no meio ambiente. Mas há um passivo ambiental enorme no Rio. Por isso, acho que seria recomendável que tivéssemos um foco mais específico nas ações voltadas para o ambiente natural - defende Saturnino.

O MP assinou no mês passado um termo de ajustamento de conduta (TAC) com o estado. Pelo documento, o estado se compromete a repassar 5% das receitas de royalties de petróleo ao Fecam. A lei atual já determina o vinculo, mas, como o fundo perdeu recursos ao longo dos anos, o MP considerou necessário assinar o TAC, para reafirmar a necessidade de financiamento do Fecam. O documento determina também que o governo destine, nos próximos 20 anos, mais R$ 363 milhões para o fundo. Esses recursos, segundo o promotor, deixaram de ser investidos em projetos ambientais entre 1995 e 2002.

A Comissão de Meio Ambiente da Alerj vistoriou o Parque da Pedra Branca há 15 dias e constatou a presença de invasões e lixo, além da ausência de fiscais. O deputado André Lazaroni (PMDB), presidente da comissão, critica a baixo percentual de verba para o IEF. Ele pediu ao Conselho Estadual de Meio Ambiente (Conema) que elabore uma norma determinando que parte dos recursos do Fecam, no exercício de 2010, seja direcionada à estruturação de todas as unidades de conservação: - Queremos que parte dos recursos seja destinada à elaboração de plano de manejo, à construção de sedes, à aquisição de veículos, à instalação de placas informativas e à delimitação física da área das unidades de conservação. A consequência da ausência desses investimentos obrigatórios é a ocorrência de invasões, desmatamentos e uma série de atividades irregulares nas unidades.

De fevereiro de 2008 a maio deste ano, o Disque-Verde da Alerj (0800 2820 230) recebeu cerca de três mil denúncias de ações contra o meio ambiente. A maioria se refere a desmatamento, ocupação irregular, poluição sonora e hídrica, além de tráfico de animais.

Segundo ambientalistas, o Parque da Pedra Branca virou alvo de especuladores, que invadem terrenos, desmatam e vendem as áreas. Um visitante do parque, que pediu para não ser identificado, conta que a unidade passou a ser alvo de milicianos.

Eles já desmataram uma área no Sacarrão equivalente a três campos de futebol. O mesmo visitante contou que o terreno está sendo preparado para ser vendido.

- Quem se arrisca a denunciar é ameaçado pelos milicianos. Eles passaram a tomar conta de tudo. Da segurança à venda de terrenos - conta o ambientalista


Secretária: dinheiro foi suficiente

A Secretaria estadual do Ambiente explica que o repasse de recursos do Fecam para o IEF foi baixo porque houve investimentos nos parques com dinheiro da Câmara de Compensação Ambiental, que as empresas têm que aplicar para reduzir o impacto das suas atividades.

Embora dependa de empreendimentos do setor privado para que surjam os recursos, a secretária do Ambiente, Marilene Ramos, afirma que a verba para o IEF em 2008 foi suficiente.

Segundo a secretaria, as unidades de conservação receberam no ano passado cerca de R$ 5 milhões da Câmara de Compensação. Para este e os próximos anos, estão previstos mais R$ 22 milhões. O dinheiro será investido em projetos como plano de manejo, infraestrutura básica, demarcação de limites, regularização fundiária e aquisição de equipamentos.

No sábado, o governo vai inaugurar a subsede Piraquara, no Parque da Pedra Branca, que terá alojamento para os novos guarda-parques.

Marilene concorda que a fiscalização e a conservação dos parques ainda estão longe do programado pelo governo. Ela diz que o estado prepara a desapropriação de 40 imóveis dentro do Pedra Branca, além de mais ações para recuperar outras unidades. A secretária acrescenta que o governo está finalizando o curso para 160 guardas-parques que vão atuar na fiscalização das unidades.

O Globo, 15/10/2009, Rio, p. 14
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