O Globo, Rio, p. 28 - 11/09/2010
Chuvas de abril destruíram 12 Maracanãs de mata
Clareiras foram contabilizadas em estudo da PUC que usou satélites. Algumas levarão 10 anos para se recompor
Isabela Bastos
Cinco meses depois das chuvas, a conta do estrago. Os temporais que caíram sobre o Rio em abril causaram uma destruição de 98.520 metros quadrados, o equivalente a 12 campos do Maracanã, no Maciço da Tijuca, por conta de 149 pontos de deslizamentos de terra, árvores e pedras. Os deslizamentos aconteceram dentro da área de preservação do Parque Nacional da Tijuca ou ainda em sua zona de amortecimento, acima da chamada cota cem (a cem metros do nível do mar). O cálculo é do Laboratório de Geoprocessamento do Núcleo Interdisciplinar do Meio Ambiente (LabGis/Nima) da PUC-Rio, que monitora a floresta, com ajuda de fotos de satélite, desde o ano passado.
Em poucos dias, danos de grandes proporções
Fruto de um convênio entre a PUC e a Secretaria estadual do Ambiente, o monitoramento mostrou que, somente dentro da área do parque, foram contabilizados 45 pontos de deslizamentos, totalizando 32.400 metros quadrados. A destruição foi classificada pelo Instituto Chico Mendes (ICM-Bio), que administra a unidade de conservação, como de grandes proporções.
Segundo o chefe do parque, Bernardo Issa, muitas das cicatrizes na mata, como as que cortam o Morro do Sumaré, o mais atingido, e que podem ser vistas do Centro, deverão levar pelo menos dez anos para se regenerarem.
- Para um evento isolado, alguns dias de chuva em abril, o estrago pode ser considerado grande. Temos áreas do parque atingidas pelas chuvas de 1996 que só se recuperaram mais de dez anos depois - diz Issa.
Para chegar à área de floresta destruída pelos temporais, os geógrafos da PUC compararam fotos de satélite feitas em maio (mês seguinte às chuvas) com outras realizadas em dezembro de 2009. Dias depois das chuvas, o Instituto Chico Mendes enumerou 283 deslizamentos de terra - incluindo os pequenos, que não chegam a ser registrados pelos satélites - nos 42km de acessos rodoviários ao parque, sem contar os deslizamentos em áreas de mata.
Segundo o geógrafo Rafael da Silva Nunes, do LabGis/Nima da PUC-Rio, a maior concentração de deslizamentos, dentro da área do Parque Nacional da Tijuca, aconteceu no Sumaré. Já na zona de amortecimento da unidade de conservação, os maiores estragos foram registrados no Laboriaux, nas imediações da Rocinha. Nesta área, as chuvas abriram cicatrizes que podem ser vistas por quem passa pela Lagoa.
Embora os deslizamentos de abril tenham sido numerosos, não superaram em área os que aconteceram no Maciço da Tijuca em fevereiro de 1996. Na época, segundo o professor do Departamento de Geografia da PUC Rogério Oliveira, foram contabilizados 730 mil metros quadrados de floresta destruídos.
- Há 14 anos não tínhamos geoprocessamento disponível. Sobrevoamos de helicóptero e fomos a campo. Desse total de 730 mil metros quadrados, foram 104 deslizamentos com mais de 500 metros quadrados. Em 1996, a chuva se concentrou sobre o Maciço da Tijuca. Desta vez a chuva caiu mais sobre Niterói. Mas ambos os eventos foram gigantescos - compara.
Biomantas de fibra de coco protegem mudas
Os deslizamentos ocorridos dentro da área de floresta do Parque Nacional da Tijuca serão vistoriados no ano que vem pelo Instituto Chico Mendes para identificar a velocidade de reação da mata e se ela precisa de ajuda para se recompor. De acordo com o chefe do parque, Bernardo Issa, caso o ecossistema não esteja conseguindo se regenerar sozinho, o órgão não descarta a realização de mutirões de reflorestamento para ajudar a fechar as cicatrizes abertas na floresta.
Boa parte dos deslizamentos ocorridos perto de estradas de acesso ao parque estão sendo corrigidos em parceria com a Geo-Rio, que desde maio faz trabalhos de contenção de encosta no parque, a um custo de R$ 5 milhões. O órgão municipal identificou 101 pontos com necessidade de obras de contenção. Desse total, 75 também apresentaram necessidade de reflorestamento, sendo 20 deles emergenciais. Para essas áreas emergenciais, está sendo aplicada uma biomanta feita de fibra de coco para proteger as encostas e as mudas. A previsão é que o trabalho termine em outubro. O órgão informou ter solicitado R$ 10 milhões ao Ministério da Integração Nacional para a realização de obras complementares e de reflorestamento nos demais pontos do parque.
A biomanta que está sendo utilizada no reflorestamento é um material é orgânico, que se decompõe ao longo do tempo.
Em toda a cidade, cerca de 20 mil metros quadrados de encostas foram tratadas com a biomanta. Somente na Autoestrada Grajaú-Jacarepaguá, foram usados nove mil metros quadrados do material. A biomanta está sendo usada ainda no Alto da Boa Vista, na Estrada da Grota Funda, na Vista Chinesa e na alça de acesso ao Túnel Rebouças, no Cosme Velho.
Desmatamento preocupa moradores da Lagoa
Vizinhos temem que troca de espécies de árvores no Parque da Catacumba crie risco de deslizamentos
Isabel de Araujo
O desmatamento para troca de árvores, autorizado pela Secretaria municipal de Meio Ambiente, de cinco mil metros quadrados do Parque da Catacumba, na Lagoa, tem tirado o sossego de moradores de edifícios vizinhos. O grupo teme assistir de camarote a novos deslizamentos de encostas na área interna do parque e reclama que os rastros das fortes chuvas de abril ainda provocam a interdição de trilhas na área de lazer.
Moradora do bairro há 30 anos, a arqueóloga Sandra Suarez lembra que seu edifício, o Villa Lobos, foi um dos primeiros erguidos ao lado do parque, e que ela e o marido chegaram a plantar árvores frutíferas na área de lazer:
- Estamos muito preocupados com a remoção das árvores e a proximidade da estação das chuvas. Não sei até que ponto isso vai abalar a encosta. Escuto o barulho da motosserras e fico apavorada.
Um guarda ambiental, que não quis se identificar, disse temer esperar mais dez anos para que obras de contenção sejam feitas no parque, como aconteceu em 1996, quando fortes chuvas provocaram deslizamentos:
- Em 96, várias encostas cederam aqui no parque, e obras de contenção e liberação das trilhas só foram feitas em 2006. Serão preciso mais dez anos para priorizarem o parque?
Responsável pela remoção das plantas exóticas e plantio de 600 mudas de espécies nativas na Catacumba, a Gerência de Unidade de Conservação (GUC) informou que a derrubada das árvores de espécie lucena e sabiá terminou nesta semana e que, em outubro, será finalizado o plantio de ipês, paubrasil, pau-ferro, cedros e jequitibás, entre outras espécies.
- A Geo-Rio analisou o solo e atestou que não existia risco de instabilidade. As áreas que cederam não foram tocadas por nós. E dependemos de um projeto da GeoRio para fazer a contenção das encostas que cederam - disse Isabela Lobato, uma das gerentes da GUC.
Através de nota a Geo-Rio informou que não remove plantas sem autorização da Secretaria municipal de Meio Ambiente em áreas de preservação, como o Parque da Catacumba. Sobre os trechos interditados, a Geo-Rio esclareceu que as trilhas estavam oferecendo riscos aos visitantes do parque. "A Geo-Rio prioriza, neste momento, as obras emergenciais em locais com risco iminente de acidentes - o que não é o caso da trilha do parque", afirma a nota.
Especialistas na área ambiental louvaram o trabalho de substituição das plantas exóticas por nativas e enfatizaram que a remoção de árvores num solo inclinado deve ser feita de forma criteriosa, com agilidade e longe do período das chuvas.
- A remoção de qualquer planta num solo inclinado provoca, sim, uma certa área de instabilidade. Mas o trabalho, sendo acompanhado pela GeoRio e feito de forma bastante cuidadosa e rápida, não deve representar riscos - salientou o professor de ecologia Francisco de Assis Esteves.
O Globo, 11/09/2010, Rio, p. 28
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